cotidiano

sentada aqui nessa mesa de café, ouvindo uma das minhas músicas preferidas da vida, e escrevendo como se não houvesse amanhã (why do you write like you’re running out of time, Maki?), tudo o que eu consigo pensar é em como eu amo ver a vida passar.

ver a vida passarFoto: Cassio Crow Fotografia

sim, eu sei, pode parecer absurdo. como assim ver vida passar? você não deveria estar por aí vivendo, fazendo coisas, conversando com pessoas? você prefere ver tudo isso passar? é isso mesmo. eu prefiro ver a vida passar.

em algum momento da nossa história, a gente colocou na nossa cabeça que a gente tem que fazer coisas pra encontrar quem a gente é. não dá pra só ficar por aí parado, sem fazer nada. isso significa que você é vagabundo e tem mais que achar um trabalho. em algum ponto da minha trajetória, eu até concordaria com você. cabeça vazia, oficina do diabo e tudo o mais.

mas hoje não. hoje eu prefiro sentar num café gostoso, tomando um chá preto gelado com limão (recomendo!) e olhando pra cada expressão da vida que passa na minha frente como se fosse uma obra de arte. como se estivesse me contanto uma história. porque é exatamente isso que ela tá fazendo.

olha ali a menina de preto e batom vermelho mexendo no cabelo enquanto conversa com um cara. se fazendo de difícil, mas sorrindo com uma doçura que entrega na hora o quanto ela gosta dele. presta atenção no moço sentado aqui do meu lado, com um Macbook enorme e fones de ouvido tão grandes quanto. com cara de intelectual, mas que tá vendo vídeos engraçadinhos no Youtube.

olha ali os meninos orientais que parecem andar em bando, mas que olham ao redor querendo fazer parte de todos os outros grupos do café, esperando ansiosamente um convite de um grupo de meninas (também orientais) pra se juntarem a elas, na esperança de que com todos juntos, ninguém se sinta sozinho.

tá vendo ali o moço no caixa, fazendo cara de quem tá odiando usar o chapéu de Papai Noel? quando ele acha que ninguém tá olhando, ele dança ao som das musiquinhas natalinhas e arruma o chapéu na cabeça pra ficar mais bonitinho.

tem um cara sentado sozinho aqui perto, mexendo no celular e passando a passando a mão no rosto a cada cinco minutos. ele parece preocupado, mas acho que, no fundo, tudo o que ele mais quer é que alguém perceba que ele está ali. eu percebo.

se a gente olhar com cuidado, cada canto desse café, desse bairro, dessa cidade, têm uma expressão de vida esperando pra ser notada. a gente chama cada expressão de ‘pessoa’ e dá um nome diferente pra cada uma delas. diz que umas são ‘homens’, outras ‘mulheres’ e que todo mundo tem que ter uma profissão diferente. e diz ainda que o conjunto disso tudo é uma ‘personalidade’.

e aí a gente olha pra esses tipos diferentes de expressão a partir dessas tais personalidades e esquece que tem um desejo por trás disso tudo, uma vontade de lembrança, um sonho de ser visto, reconhecido, de ser encontrado. todo mundo acha que tá perdido e precisa de alguém pra olhar e falar ‘meus deus, então é aqui que eu tô?’. é, sim, bem-vindo de volta. agora sai por aí e faz com os outros a mesma coisa que eu fiz com você, tem muita gente pra lembrar.

por isso, ao invés de fazer um monte de coisas, eu prefiro ver a vida passar, na esperança de que um de vocês um dia me notem de volta, e levem com vocês o que eu tenho pra entregar. e eu tô dando de graça, viu? não tô cobrando nada por isso. ó, leva aqui essa lembrança da vida que você já tem, distribui pra todo mundo, experimenta viver um pouquinho disso todo dia, olha como é bom.

mas enquanto isso não acontece, eu espero que o menino bonitinho pegue a mão da menina de preto, que deixou os braços estendidos sobre a mesa, esperando pelo contato. eu olho o moço de chapéu de Papai Noel e sorrio ao invés de achar o uniforme brega. eu olho pro intelectual do meu lado e dou uma risadinha do vídeo de gatinhos que ele tá vendo. e eu relato tudo isso num blog. torcendo pra que um dia alguém também tropece nesse link e entenda a minha mensagem.

ela diz assim: ‘toma aqui esse tanto de vida que você já tem. lembra de levar sempre com você.’

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Escrito pelaMaki
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8 Comentários
  1. Hellen  em dezembro 26, 2016

    Engraçado, também gosto de “ver” as pessoas, colocamos tanta beleza pra fora e fico a imaginar o que as pessoas guardam pra sim, aquele SORRISO MEIA BOCA QUANDO NA VERDADE NÃO GOSTARAM DE ALGO QUE OUVIU OU AQUELE TUDO BEM QUANDO GOSTARIA DE RECEBER UM ABRAÇO APERTADO. FICO PERGUNTANDO O QUÃO AUTENTICO REALMENTE CONSEGUIMOS SER .

    • Maki  em dezembro 26, 2016

      ser autêntico, ser fiel ao que a gente é de verdade, é um trampo mesmo. mas acho que a gente não precisa ficar preocupada com isso, sabe? é mais um exercício de se lembrar o tempo inteiro de que quem nós somos não precisa de esforço, só é e ponto. <3

  2. Bruna Pezzan  em dezembro 24, 2016

    OI, MAKI.
    VOCÊ SABE QUE ESSA MANIA DE FICAR VENDO A VIDA PASSAR E OBSERVAR O “MUNDO” AO NOSSO REDOR É CARACTERÍSTICA DAQUELES QUE TEM ALMA DE ESCRITOR, NÉ? HAHA.
    MENINA, AMEI O SEU TEXTO. CONHEÇO O DESANCORANDO HÁ ALGUM TEMPO, MAS, COM A CORRERIA, FIQUEI ALGUNS MESES SEM APARECER POR AQUI. HOJE, SEM QUERER, ME DEPAREI COM O SEU BLOG! E JÁ TE CONTO: FOI MUITO BOM RETORNAR.

    ADOREI O SEU TEXTO, MESMO! PRETENDO CONTINUAR APARECENDO POR AQUI.
    BEIJOS

    http://WWW.BRUNAPEZZAN.COM

    • Maki  em dezembro 26, 2016

      oi, Bruna! aparece sempre, é uma alegria te ver por aqui <3
      e pode ser coisa de escritor mesmo, mas acho que todo mundo tem que desenvolver essa 'habilidade', sabe? essa coisa de parar pra lembrar que a vida é mais do que as coisas que a gente tem pra fazer no dia a dia. cê num acha?

  3. Natália Oliveira  em dezembro 22, 2016

    Ver a vida passar é bem relaxante. Eu acho, pelo menos. É como você disse, tem várias pessoas ali esperando pra serem vistas. A humanidade na sua forma mais natural, cheia de peculiaridades. É bacana poder ser o observador, prestar atenção nos detalhes e diminuir um pouco a correria. A gente tem a impressão de que, quando ficamos observando, sem fazer nada, estamos desperdiçando a vida. Mas, as vezes, parar e observar faz com que a gente aproveite muito mais o tempo.

    • Maki  em dezembro 26, 2016

      é exatamente o contrário, né? a gente acredita muito que tem que fazer coisas pra viver a vida. mas a gente só tem que lembrar que ela existe e que tá dentro de cada um de nós! <3 é só a gente querer ver, né?

  4. Erika/SP  em dezembro 21, 2016

    Oi Maki, eu tbm adoro observar a vida passar, ver a natureza, as pessoas (principalmente na Paulista, ou nas pracinhas, parques…. 🙂
    A vida aqui em SP é tão corrida e doida, que quando a gente para pra pensar e olhar ao nosso redor, a gente se dá conta das coisas boas que acontece e a gente nem percebe na correria….
    Sabe que eu ia te sugerir, que vc listasse as coisas que vc está curtindo no momento, pode ser mensalmente, ou como vc quiser, acho muito legal essa “troca” de informações de coisas que as pessoas estão gostando, tipo música, produtinho de casa, de beleza, de comida, lugar que mais gostou de ir no mês….fica a sugestão! 😉
    BEijocas com gostinho de Natal, pq já tá aí né!!! 🙂

    • Maki  em dezembro 26, 2016

      oi, Erika! exato, a gente as coisas passarem porque se distrai com outras que, no fundo, nem são tão legais ou importantes assim. e perde a oportunidade de olhar pro outro e pra tudo com carinho, sabe? <3
      adorei a sua sugestão! vamos ver se consigo fazer! se bem que o resumaki (aqui: http://desancorando.com.br/2016/11/30/resumaki/) eu meio que já fiz isso, né? um beijo!