cotidiano

o que a gente diz quando fala consigo mesmo? ‘oi?’ ‘bom dia?’ ‘como vai você?’ essa última é bem redundante. eu mesma deveria saber como as coisas estão indo. conversaria mais vezes com você se não fosse uma perda de tempo, 90% das vezes. os outros 10% a gente até consegue ter uma conversa amigável e se entender. mas só de vez em quando, nos poucos encontros em que você decidiu ser bonzinho.

eu andei pensando muito em você. quer dizer, em mim mesma. ah, sei lá. andei pensando muito. não que isso seja novidade, eu sempre penso demais. mas andei pensando sobre essa nossa relação e que talvez eu esteja cansada disso tudo. afinal, pra quê? pra que a gente gasta tanto tempo tentando entender você quando a gente bem sabe que você não quer ser entendido?

eu lembro que quando era mais nova, vinham uns pensamentos loucos na minha cabeça. do tipo ‘eu sou incrível’, ‘eu sei que eu consigo’ e ‘eu sou livre’. fiquei horas acordada no domingo pensando onde esses pensamentos foram parar e em que momento da minha puberdade eles sumiram por completo para serem substituídos por outros de autodepreciação. ‘você não merece’, ‘você não vale nada’, ‘você não é bonita’.

quando foi que eu achei pela primeira vez que deveria ficar sozinha pra sempre e que o mundo não valia a pena? por que eu pensei nisso? quando foi que a gente se desentendeu ao ponto de eu dar mais atenção pra você do que pra mim mesma e ficar focada nas milhares de palavras maldosas que você me dizia diariamente? não sei. também não sei se faz sentido querer saber disso agora. são águas passas que, querendo ou não, me ajudaram a chegar onde cheguei.

ainda assim… você me fez pensar. me perguntar por que. por que a gente faz o que faz? qual o propósito disso tudo? pra quê eu quero ficar mais 40, 50 anos num mundo cruel e hostil matando um leão por dia e esperando que as coisas ‘deem certo’? por que eu preciso aprender coisas e me especializar e saber cada dia mais e trabalhar e ganhar e dinheiro… pra quê? qual o sentido disso tudo?

você não sabe a resposta, é claro. mais do que qualquer coisa, acho que você quer manter esse loop de perguntas eterno até que eu desista de encontrar uma resposta e stick to the status quo. pronto, agora eu lavo as minhas mãos, acabou por aqui, você venceu. eu me entrego.

é isso que você quer, né? você quer que eu desista, que eu deixe tudo no seu devido lugar, que eu ouça os seus gritos e sinta pena. que eu chore com você. que eu sofra junto e me identifique com os seus medos e inseguranças. você quer que eu não tenha propósito, que eu continue perdida. pra você é mais negócio do que se eu achar uma saída pra essa bagunça.

então, não. eu não vou parar de perguntar. eu preciso saber o porquê. por que eu vim pra cá? o que que eu tô fazendo aqui? qual a minha função? se não é você quem vai me responder, não tem problema. eu espero uma força maior me mandar um sinal. eu juro de pé junto que vou ficar de olhos abertos, atenta, só esperando. eu sei que a resposta vem uma hora ou outra, ela tem que vir.

se não… se não você ganha. e eu me afundo de novo nas dúvidas, nas inseguranças, nos ‘eu não consigo‘ e ‘não aguento mais ficar sozinha‘. nos dias trancados no meu quarto, deitada na cama sem saber pra onde ir, pra quem correr. sem saber que eu posso pedir ajuda.  sem nem achar que a ajuda vai vir. assim você corre livre, e eu fico presa nessa jaula que você criou, mudando a corrente de um pé para o outro só pra parecer que eu tô seguindo em frente.

não, obrigada. eu dispenso. passei anos dando ouvidos pra você. e onde é que isso me levou? onde me levaria? será que eu ainda estaria aqui se tivesse seguido os seus conselhos? algo me diz que não. pode esquecer, não adianta implorar. eu não te quero mais.

por um lado, eu sei que a gente é a mesma coisa, e não tem nada que me separe de você – nem é isso que eu quero. eu só… cansei. cansei de você e das suas mentiras. cansei da sua manipulação, do seu controle. do seu desejo inato de machucar e tentar fazer melhor que todo mundo. de me usar pra se defender.

cansei. cansei mesmo. chega. eu tô exausta desse joguinho manipulador que não dá em nada. cansada de não conseguir ouvir outra coisa a não ser as suas reclamações. você é a melhor definição de disco quebrado que o mundo já viu.

você não sabe o que é amor. nem tente me ensinar. por você eu passei tantos anos longe disso que a minha garganta fica travada só de lembrar. eu sei, pode ser que tenha um pouco de raiva nesse discurso, mas se eu não colocar isso pra fora, eu explodo. mas você precisa saber. precisa mesmo. às vezes, a gente só percebe que tá fazendo alguma coisa errada quando alguém conta. aí fica escancarado. fica na cara, aí não dá pra evitar mais.

talvez você queria ignorar isso tudo e continuar gritando na minha cabeça. talvez você comece a planejar a sua vingança silenciosamente. talvez, se eu treinar bastante e se não der brecha, você desapareça. só talvez. eu espero que sim. e eu espero que seja logo. porque eu cansei de você me dizendo o que fazer, sem me contar qual vai ser o resultado final. agora eu vou tomar as minhas decisões sem você, mas nunca sozinha. esse relacionamento abusivo acabou.

passar bem. esse é o meu último contato com aquilo que não me acrescenta, e o meu primeiro vislumbre do que é ser livre de verdade. felizmente, eu vou seguir esse caminho sem você.

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Escrito pelaMaki
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