escrita criativa

quando o despertador toca, a primeira coisa que eu penso é que já é tarde pra levantar. o dia nem começou e eu já tô atrasada. culpo os cinco minutinhos a mais do botão soneca, que apertei insistentemente pelos últimos 15 minutos. olho o caderno fechado na mesa de cabeceira e penso “agora não vai dar, eu tento mais tarde”. mas é aquela coisa, o “mais tarde” nunca chega. eu emendo a academia no banho, o banho no café da manhã, o café da manhã com o passeio do cachorro, o passeio do cachorro com 20 minutos nas redes sociais, os 20 minutos nas redes com o trabalho – e assim segue o dia. uma interminável corrente de eventos que eu não controlo muito bem, na minha própria versão de um dia da marmota. quando vejo, o relógio me olha acusadoramente dizendo que já passou da hora de dormir e a cabeça bate na cama sem nem se dar tempo de registrar que o sono chegou. antes de dormir profundamente, um único pensamento corre a minha mente de um lado a outro

“hoje faltou tempo pra escrever. amanhã eu tento de novo”.

falta de tempo pra escrever

então… acho que a gente vai precisar ter uma conversa meio séria sobre essa história de falta de tempo pra escrever. dia desses eu perguntei lá no Twitter quais eram as principais dificuldades em relação a escrita que as pessoas tinham, e essa frase, especificamente, foi uma das que mais apareceu: “me falta tempo pra escrever”, “não consigo encontrar tempo pra escrever” e todas as suas variantes.

e eu entendo. juro que entendo. essa dificuldade é absolutamente acolhida por aqui, nada de julgamentos, nada de testas franzidas e um “como assim?!” indignado, nada de “você deveria tentar mais” ou “faz isso daqui, vai dar certo”. não, nada disso. aqui a gente fala sério. e pra falar sério sobre esse assunto, específico, a gente precisa começar de um jeito que é igualmente sério – e pode ser meio chocante. mas, se você lê esse blog há algum tempo, já deve ter topado com essa informação uma vez ou outra:

não existe falta de tempo. existe falta de priorização.

tá, eu vou dar uns minutinhos pra você deixar essa frase entrar na sua mente e no seu coração. que gosto ela tem? parecei muito amarga? eu entendo. é um pouco difícil aceitar. mas, acredite, é só a partir disso que a gente vai conseguir continuar a conversa. pronto? deu? então, vamos lá.

quando a gente fala de tempo, é muito fácil a gente medir o que faz a partir de um viés de produtividade: quanto mais você produz, melhor está usando o seu tempo e tudo mais. e, nisso, a gente briga um monte com a nossa própria procrastinação, com as dificuldades cotidianas, com o viver uma pandemia e tudo mais. considerando tudo isso, o que eu quero dizer é que é fácil a gente se cobrar por uma coisa que, na verdade, só não é uma prioridade na nossa vida.

(aqui, eu sempre lembro daquele TED Talk do Tim Urban falando sobre procrastinação e como ela funciona de verdade.)

mas, se você prestar atenção, mesmo nessa bagunça temporal, tem coisas que acontecem independente de um querer consciente. no fim das contas, você entrega o relatório, faz a prova, sai com um amigo, assiste um filme… de certa forma, essas coisas viram uma prioridade na sua lista de tarefas e isso ocupa o seu tempo. se você passa muito tempo nas redes sociais, por exemplo, significa que isso é uma prioridade pra você, mesmo que isso não seja muito claro e mesmo que você saiba que, no fundo, esse rodar pelo feed sem motivo algum é, na verdade, um mau uso do seu tempo.

então, vamos ser sinceros aqui e assumir que a questão não é o tempo, é, na verdade, a sua lista de prioridades. e isso é muito importante e faz toda diferença, inclusive na forma como você se sente sobre isso. uma coisa é você falar que lida com “falta de tempo pra escrever“. automaticamente, somos afogados por uma onda de culpa e não-realização, sobe no horizonte um grande outdoor vermelho e piscante com a palavra “fracasso” em letras garrafais, o céu escurece e ouve-se trovejadas à distância. é o próprio apocalipse criativo.

outra coisa é “escrever não é uma prioridade agora“. não precisa nem de texto descritivo aqui. já dá pra perceber a diferença, né? eu acredito que sim.

mas, se mesmo considerando tudo isso, você percebe que escrever pode se tornar uma prioridade pra você ou você quer entender como sair dessa visão de falta pra de prioridade, tem duas coisas importantes que você pode considerar.

1.descubra a sua motivação

essa é mais uma das teclas que eu bato sempre quando o assunto é escrita (e qualquer outra coisa, na verdade). se você quer escrever, qual é a sua motivação? encontrar uma motivação clara é a forma mais rápida de lembrar a si mesmo do porquê você quer tentar algo novo ou inserir um novo hábito na sua vida. o que você quer com isso? é ter clareza do que falar na terapia? é desabafar? se comunicar melhor com o seu público na internet? escrever um livro? por que, exatamente, você quer escrever?

pra mim, isso é muito fácil de responder: escrevo porque é a minha forma mais confortável de expressão. faço isso tanto pra mim mesma, pra clarear a mente, quanto pra compartilhar o que acho interessante / aprendo com as pessoas. e isso fica martelando na minha cabeça de um jeito que não sossego até escrever tudo que tá na cabeça. acho que é por isso que nunca desisti completamente de blogar (e, provavelmente, se tivesse parado já teria começado outro!)

2. comece pequeno

de novo, mais uma daquelas coisas que eu falo sempre aqui. vamos supor que você encontrou uma motivação que, realmente, faz você querer começar a escrever agora. mas antes de gastar todo o seu gás criativo escrevendo por seis horas seguidas (pra depois nunca mais) que tal começar pequenininho? lembra quando eu falei do PAK, o projeto que eu fiz pra retomar o hábito de escrever diários? pois é. eram só 10 minutos por dia. hoje, devo passar, em média, uns 20 a 30 minutos escrevendo de manhã no meu diário. mas eu comecei com dez minutos cronometrados (sério! colocava o timer e tudo). vai devagar, coisinha! começa pequeno, um pouquinho por dia.

a questão, aqui, é entender que esse pequeno tempo de escrita tá disponível no seu dia. se a sua motivação for forte, encontrar esse tempo vai ser fácil. ao invés dos 20 minutos no Instagram, 20 minutos escrevendo. é uma substituição mesmo. vira uma prioridade. e o ciclo fecha. a partir daí é só uma questão de prática pro hábito se desenvolver e você começar a ver, inclusive, a sua evolução na escrita.

o bom é que isso vale pra tudo. tudo mesmo. qualquer coisa que você queira fazer se encaixa nesses dois pontos. motivação e começar pequeno. eu sinto que, ao longo do tempo, foi assim que eu driblei a falta de tempo pra escrever. é assim que eu ainda driblo e o porquê, muitas vezes, de eu passar os meus sábados à tarde escrevendo posts pra cá. longe de mim romantizar o trabalho no fim de semana, mas só acontece porque, no meu coração, isso é importante e, portanto, uma prioridade. eu faço assim que der, quando dá.

a cola da gentileza

tem mais uma coisa. na verdade, num é nem um ponto específico, mas é algo que faz parte de toda construção também. tem a ver com gentileza. e o quanto, nesse processo, você precisa ser gentil com você mesmo. tenho falado muito sobre gentileza porque tenho pensado muito no assunto e no quanto eu posso ser mais gentil comigo nos meus dias. o que quero dizer é que você não precisa se cobrar tanto assim por algo que não está fazendo e que não é uma prioridade pra você. se esse, de fato, for o caso… deixa a coisa ir. deixa ela seguir o rumo. se for pra acontecer, um dia escrever vai voltar na sua cabeça como algo que você quer tentar e, nesse novo momento, talvez seja uma prioridade e talvez aconteça.

se, ao contrário, você sente que é uma prioridade agora, então, seja gentil também. começa pequeno, com calma, no seu ritmo. não precisa seguir a correria do mundo. tá tudo bem se você der um passo por vez. já dizia Murakami que, se não for agradável, então nem faz sentido escrever. e eu concordo. se não for agradável, deixa pra lá.

mais recentemente, comecei a ler A Coragem de Ser Imperfeito, da Brené Brown, e fui avassalada pelo o que ela fala sobre a cultura da escassez em que a gente vive, o quanto é fácil a gente se olhar por um viés de falta, de “não faços”, de metas não cumpridas, e esquece do quanto a gente já é suficiente e corajoso em fazer o que faz todos os dias. tenho tentado ver mais as coisas por esse lado e, veja só, tenho achado bom demais.

uma última coisa, antes da gente ir cada um pro seu lado: se você sente que gostaria mesmo de voltar a escrever (ou começar) o clube de escrita desancorando pode ser uma ideia pra você. eu ofereço um exercício por mês que você pode fazer no seu tempo, quando quiser e se sentir inspirado, e no final de cada ciclo a gente senta todo mundo pra conversar sobre dificuldades, descobertas e experiências. é muito legal e acolhedor. fica a dica. ah, e muito obrigada a quem já é membro e me permite explorar e testar e inventar coisas novas por lá sempre que me dá na telha. vocês são incrivelmente corajosos ❤️

então, é isso. motivação. pequenez. gentileza. a tríade pra driblar a falta de tempo pra escrever. coloca aí na sua caixinha de ferramentas essas três coisas. revisita de tempos em tempos, pra ter certeza que tá tudo alinhado, e segue em frente. tá tudo bem com você (e o seu tempo).

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Escrito pelaMaki
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4 Comentários
  1. Bianca  em julho 15, 2021

    essas três coisinhas que você mencionou são justamente o que me fizeram continuar com meus pequenos hábitos que já viraram rituais no meu dia, é realmente transformador. uso essas coisinhas (incluindo a escrita no meu diário) para me ancorar e trazer serenidade nesses tempos tão caóticos.

    • Maki  em agosto 07, 2021

      aaaaaa que amor saber disso, Bianca! ♥︎

  2. Emerson  em julho 14, 2021

    Que texto acalentador! Eu sou apaixonado por escrever. Escrever me liberta e me ajuda a esquecer dos meus problemas.

    Boa semana!

    Jovem Jornalista
    Instagram

    Até mais, Emerson Garcia

    • Maki  em agosto 07, 2021

      pra mim também passa essa sensação, Emerson!