cotidiano

Querida Autoestima,

Sim, isso não é uma brincadeira, eu estou mesmo escrevendo uma carta aberta para você. Eu sei, tem muito tempo que a gente não conversa e, para ser bem sincera, por muitos anos eu nem sabia que você existia. Foi mal. Mas, sim, você sempre esteve lá, no fundinho da minha mente, esperando o momento certo para aparecer.

carta-aberta-autoestima

O problema AE – posso te chamar assim, ? somos todas amigas aqui – é que eu sofria de uma coisa muito estranha chamada Baixa Autoestima. Ainda sofro, aliás. Curioso, ? Como pode isso?

Mas é verdade. Eu achava que você não existia justamente porque a Baixa falava mais alto do que você. Me dizia – e ainda diz – que eu não fui nem nunca serei boa o suficiente, bonita o suficiente, profissional o suficiente, bem sucedida o suficiente… Ela vivia me comparando aos outros, sabe, e isso é muito chato. Cada um é cada um, não tem essa de comparação. Da forma que ela colocava, todo mundo parecia melhor do que eu.

Falando sério AE, por muitos anos a Baixa ganhou. Eu lembro que teve um dia que meu pai me disse que eu não era inteligente, era esforçada. Lembro disso como se fosse hoje, pela manhã, antes de sair para a escola, com ele tentando fazer o meu irmão entender que ele sim tinha a inteligência necessária para grandeza. E nesse dia a Baixa me pegou de jeito e repetia para mim todos os dias que eu não era inteligente.

E a partir daí ela ganhou de mim. De qualquer resquício seu que ainda existia lá dentro da minha cabeça esforçada-mas-não-inteligente. A Baixa me dizia que eu não era capaz, e eu acreditava. Ela me disse que eu não valia o esforço, que não adiantava nem eu tentar porque não daria certo mesmo. Acredita nisso?

Baixa brincava com a minha cabeça. Me dava esperanças de que algo ia dar certo, me deixava acreditar por um momento que eu conseguiria, que eu conquistaria todos os meus sonhos, o mundo inteiro se eu quisesse, para depois tirar o tapete rápido demais de debaixo dos meus pés e me deixar com as mãos arranhadas e o rosto dolorido da pancada.

Sabe AE, a Baixa me fez sofrer muito. Me fez chorar e sentir demais aquilo que eu não deveria sentir. Me fez perder cabelos, peso, amigos e um pouquinho de vida também. Me fez ver o mundo através de quatro paredes e me prendeu ali como se fosse uma prisão de segurança máxima, com vigias 24 horas, 7 dias por semana, me mantendo encarcerada dentro da minha própria cabeça, da minha própria miséria.

Baixa fez com que eu me apaixonasse pelas pessoas erradas, sofresse por um amor que nunca existiu e deixasse momentos da minha vida passarem em branco, levados pelo vento numa tarde de outono, enquanto em eu me enrolava no cobertor e pensava que talvez dormir fosse melhor do que estudar, porque eu nunca tiraria 10 naquela prova mesmo.

Pior do que tudo isso, a Baixa me fez ter certeza de que eu não merecia ser amada. Nem por mim mesma. E essa, eu acho, é a maior dor que alguém pode sentir. Eu vivia encolhida, pelos cantos, como aquele personagem de desenho animado que dizia ‘Ó céus, ó vida, ó azar…’. Era isso. Eu colocava a culpa no azar.

E, verdade, a Baixa existe. Ela é real e está ali, na minha cabeça, esperando o menor dos fraquejos para tomar conta novamente. Ela é uma criação circunstancial, claro… Mas também é uma criação minha. Eu deixava ela se alimentar todos os dias de um pedaço do meu coração. Até sobrar só um espaço oco no peito, me deixando completamente desnorteada e sem saber para onde ir, o que fazer. Perdida mesmo, sabe?

Mas o que queria dizer de verdade, AE, é que eu comecei a brigar de volta. Foi preciso eu sair do país para aprender um pouquinho sobre a minha própria capacidade de grandeza. Mas eu aprendi. E se eu sofro hoje, se choro, se me sinto triste, é porque percebo que sou muito maior do que a Baixa me faz acreditar. E lutar contra ela é bem difícil também.

Eu olho no espelho e digo ‘você consegue!’, e ela rebate com um desdenhoso ‘yeah, right!’. Mas sabe o que eu percebi? Que se eu começar a mostrar a língua para o espelho logo em seguida, começa a ficar bem mais difícil de prestar atenção no que ela diz. Infantil, mas funciona.

E eu te descobri, ? Pouco a pouco, você apareceu de novo, como uma luzinha no fim do túnel (e agora a Baixa grita no meu ouvido ‘Cuidado! Pode ser um trem!‘). E cada dia que passou desde então eu aprendi um pouquinho mais sobre mim e sobre você também. E como você é importante para a minha vida funcionar melhor. Eu sei o que eu quero e você pode me ajudar a chegar lá, enquanto a Baixa só vai – haha – me colocar para baixo, gritando com cada vez com mais fôlego que eu não vou conseguir.

Eu prometo me esforçar muito para não dar ouvidos. Mesmo que o esforço seja a minha inteligência. Prometo mesmo. E prometo também tentar conhecer cada vez mais desse seu amigo tão próximo, o Amor Próprio. Ele parece ser um cara legal e já percebi que também tem muito a me ensinar.

AE, você me desculpa? Eu sei que escrevo demais e penso demais também – o alimento preferido da Baixa, os meus pensamentos -, mas eu precisava contar tudo isso. Não queria que você se sentisse menos amada só porque cultivei uma cultura de autosabotagem que nunca me fez bem. E peço desculpas por pedir desculpas, sei que você não gosta, que você diria ‘para com isso! Bola pra frente, mulher!’, mas eu preciso, entende? Faz parte do processo de cura. Eu preciso me perdoar. E preciso perdoar a Baixa também, apesar de que prometi nunca mais conversar com ela. Aquela ali é uma aproveitadora de primeira linha. Ataca a menor sombra de dúvidas. E eu tenho muitas dúvidas ultimamente.

AE, diz que me ama? Ou melhor, diz que eu me amo? Me ensina um pouquinho mais sobre essa minha capacidade de correr atrás das coisas e tornar os meus sonhos realidade, porque eu quero muito aprender. Passei tempo demais sonhando e agora que vi o mundo real, eu quero mais. Me mostra?

Espero que não tenha problemas pedir um favor desses. Sei que é muito difícil me ensinar a me amar mais. Mas eu quero mesmo aprender e acho que isso já é meio caminho andado, não é o que dizem?

AE, sei que posso ter momentos de fraqueza vez ou outra. Não repara, ? A Baixa, sua irmã gêmea do mal, ainda me segura forte com aquelas mãozinhas maléficas. Mas eu sinto o seu aperto afrouxar um tiquinho a mais cada dia. E eu vejo a sua mão chegando mais perto, para me dar aquela segurança que eu tanto preciso para enfrentar o mundo.

Fica bem, AE? E me espera que eu tô chegando. Manda um abraço pro Amor Próprio também, avisa que eu quero muito conhecê-lo. A gente se vê em breve.

Beijos,

(PS: Este post foi publicado originalmente no Manias de Moça)

Compartilhe!
Escrito pelaMaki
Deixe seu Comentário!


Warning: Undefined property: stdClass::$comments in /home1/desan476/public_html/wp-content/themes/plicplac/functions.php on line 219
13 Comentários
  1. Clara  em outubro 27, 2015

    UM DOS TEXTOS MAIS LINDOS E MARAVILHOSOS QUE EU JÁ LI NOS ÚLTIMOS DIAS. E ENGRAÇADO SEU PAI TER FALADO QUE VOCÊ É ESFORÇADA, PORQUE ISSO ME REMETE A OUTRA COISA, DE UMA FORMA POSITIVA. UMA VEZ VI EM UMA NOVELA COREANA A SEGUINTE FRASE “ESFORÇO É APENAS OUTRO NOME PARA VITÓRIA” E EU FIQUEI PENSANDO NAQUILO E GUARDEI A FRASE PARA SEMPRE, ENTÃO AGORA REPITO ELA PARA VOCÊ : VOCÊ É UMA MENINA VITORIOSA.

    NÃO DEIXE SE ABATER PELA BAIXA AUTOESTIMA, PORQUE VOCÊ É LINDA, É INTELIGENTE, ESCREVE TEXTOS MARAVILHOSOS, E TEM UM MONTE D EQUALIDADES QUE VOCÊ DEVE SEMPRE CULTIVAR. <3

    • Maki  em outubro 27, 2015

      Oi, Clara!
      Poxa, que linda você! Muito obrigada mesmo pelo seu comentário, fiquei muito feliz! Vou guardar essa frase pra vida também!
      🙂

      • Luh  em março 09, 2022

        Quero conhecer o amor próprio tambm

  2. KARINE  em outubro 23, 2015

    Maki, que texto lindo!
    Fiquei até emocionada aqui <3

    • Maki  em outubro 24, 2015

      <3 eu sou muito apaixonada com esse texto

  3. Bessie B.  em outubro 22, 2015

    Maki, adorei tua reflexão! Confesso que faz tempo que me conciliei com a minha auto estima e com o amor próprio, mas sei que muita gente tem dificuldade. Mas tem que ter não, a gente tem é que ser feliz <3 beijo!

    • Maki  em outubro 22, 2015

      Concordo, Bessie, a gente tem que ser feliz! Pra mim virar essa chave foi superimportante <3

  4. joyce coeli  em outubro 21, 2015

    Obrigada, porque é assim que me sinto tb.Fui criada assim para não ser boa o suficiente ou inteligente o bastante e a insegurança bate forte e com isso a baixa estima vem junto.Vou bater um papo com a minha AE por aqui quem sabe ela não me socorre? Bjs.

    • Maki  em outubro 21, 2015

      Oi, Joyce!
      Faça isso, conversa com ela que eu tenho certeza que ajuda!

  5. Camila rech  em outubro 20, 2015

    QUE TEXTO! Fiquei sem fôlego! é dificil mesmo lutar contra a “baixa” eu que o diga, lutei tanto tanto tando, desde a adolescência e acho que hoje em dia eu venci de vez ela (claro as vezes ela da as caras) mas faço de tudo pra não deixar a “baixa” vencer. Eu sempre levo comigo a frase: “se eu não me amar, quem mais vai?”. 🙂 Fica bem linda! Tu é muito mais do que pensa,acredite em você! 😀

    • Maki  em outubro 21, 2015

      Antes de mais nada: AI MEU DEUS NUM ACREDITO QUE VOCÊ COMENTOU NO MEU BLOG.
      Passado o momento fangirl: essa frase é maravilhosa! Ando pensando muito nela mesmo e entendendo aos poucos como ela é verdadeira. É impossível a gente amar outra pessoa se não se amar primeiro. E o mesmo vale para se sentir amada, né?
      Muito obrigada <3

  6. Mariana  em outubro 20, 2015

    Makiiii, mulher, adoreii essa sua postagem, e todas as outras! Juro que toda vez que passo por aqui, leio tudinho que você escreve, pois amo amo amo seu blog (é sério), e adoro tudo o que você escreve, você tem um dom que vi em poucos, viu? Acho perfeito o Desancorando, a forma que você distribui os conteúdos, falando de coisas realmente importantes… Ah, sério, esse post especificamente me tocou muito, pois sou muito assim também, e fico feliz em saber sobre sua melhora! Nossa, se você se visse pelos olhos dos outros, você veria como é especial e talentosa e inteligente!! Sou sua fã!!!
    Vou parar por aqui, pra não parecer exagerada, mas saiba que você está mudando a vida das pessoas com esses posts, eu pelo menos já melhorei muito desde que comecei a ler seu blog, sériooo!!!
    Xero, Mari.

    • Maki  em outubro 21, 2015

      Oi, Mari!
      AFE MENINA NÃO ME FAZ CHORAR. Fiquei emocionada com o seu comentário, sério mesmo. Você não tem ideia de como é importante pra mim saber que o que eu escrevo tem te afetado dessa maneira. Minha missão já foi cumprida! Espero te ver muito mais vezes por aqui! <3