sinto que dei uma volta completa no sol, em meu próprio movimento pessoal de translação, quando começo esse post com mais um trecho da música Cananéia, Iguape e Ilha Comprida, do Emicida:
(essa aqui também é uma forma de oração.)
escrevo como quem manda cartas de amor.
é que ela me veio na mente agorinha pouco, enquanto pensava como faria pra escrever esse post – que, por sinal, é mais um daqueles fora do planejamento, e que, dessa vez, surgiu de uma conversa maravilhosa com a Maíra. a gente tava falando sobre um monte de coisas e, de repente, caiu em escrita. não que eu esteja reclamando. se pudesse, passaria o dia inteiro falando sobre isso.
mas o que eu percebo é que tem na minha mente uma coisa que eu sinto dificuldade em transmitir, sabe? e me vejo mais uma vez escrevendo sobre o assunto pra saber o que eu penso exatamente sobre ele, porque a verdade é que a escrita mudou a minha vida. e muda, todos os dias, um pouco mais.
fico pensando como passar isso pras pessoas, sabe? como ensinar que a escrita é uma ferramenta tão poderosa a ponto de mudar a vida de alguém? que difícil, né?
e mesmo escrevendo sobre isso, eu sinto um nó no coração porque não é exatamente assim que eu queria falar sobre o tema, e as palavras parecem me falhar no momento em que mais preciso delas – não é à toa que eu procrastinei escrever esse post até o último segundo. como diz Murakami:
não produzo absolutamente nada quando não quero escrever, quando não tenho vontade. só começo a escrever de forma decidida quando me dá vontade.
tive que tirar um pouco de leite de pedra aqui, juro pra você, porque parece que falar sobre o que é mais importante pra mim é também o mais difícil. mas aí, eu tava aqui casualmente navegando pela internet buscando inspiração quando vi uma arte da Antonella Vanoni com os dizeres “do fundo do meu coração” – mais um trecho dessa mesma música -, e uma coisa levou a outra e eu corri no Google pesquisar a letra mais uma vez e conferir se tinha, mesmo, a palavra “oração” em um dos versos. tinha.
e cá estamos.
mas a verdade é que a ideia pra esse post começou a ganhar corpo ontem de manhã quando eu tava escrevendo as páginas matinais e me perguntando como ensinar pras pessoas o poder de uma ferramenta tão simples. sabe, boa parte de nós aprendeu a escrever quando pequeno, e eu já falei sobre isso aqui, mas acho que a gente perdeu o contato com como escrever é catártico.
escrever é uma forma de oração.
todos os dias de manhã, eu oro. mas a minha oração não é mentalizando pedidos ou palavras bonitas pra Deus, mas colocando no papel o que ocupa a minha mente em busca de soluções. Deus tá nisso também, sabe, porque acaba sendo uma conversa minha com Ele.
e, sim, esse é mais um daqueles textos que começa numa coisa mundana como uma música (linda, por sinal) e para em Deus.
mas é uma conversa. é um momento que eu tenho comigo mesma em que eu busco entender o que eu penso e o que eu sinto. é como eu organizo as minhas ideias pra transferi-las pra qualquer lugar depois disso. normalmente, os meus momentos de baixa criativa (pra não dizer bloqueio, que a gente já sabe que não existe, lembra?) são repletos de poucas palavras escritas e muitas mecânicas diárias. volto pro caderno, pro teclado e paro pra fazer o que deveria estar fazendo desde sempre.
isso me lembra – de novo – o discurso do Neil Gaiman, o “Faça Boa Arte”, em que ele fala como um dia percebeu que tava respondendo e-mails de mais e escrevendo de menos e voltou a fazer o que queria (e responder menos e-mails, de quebra).
mas eu to divagando. às vezes, penso que o papel e a caneta são, mesmo, meus melhores amigos. porque tem algo sobre escrever – e escrever qualquer coisa -, que é extremamente curador. sabe que o termo “escrita expressiva” vem disso, da capacidade da escrita ser usada como ferramenta terapêutica para pessoas que sofreram grandes traumas.
acho que, pra mim, escrever é o equivalente a colocar a minha música preferida pra tocar alto e dançar até esquecer os meus problemas (alô, Christina Yangs e Meredith Greys da vida real). é a minha forma de fazer como Kimmie Schmidt e pular gritando “eu não estou aqui de verdade”, porque, quando escrevo, eu não estou mesmo. aqui. nesse plano físico esquisito que a gente passa os nossos dias. eu to em outro lugar, fazendo outra coisa. tô olhando pros meus pensamentos e colocando cada um deles em uma folha de papel na certeza de que não serei julgada. e, se for, serei só eu mesma julgando o que eu mesma penso e até esse auto-julgamento vai pra folha.
comentei outras vezes que escrever em blogs, pra mim, era meio que escrever um diário público, só que eu não tinha muita noção de que tinham pessoas de verdade lendo o que eu escrevia. “é tipo gritar pro vazio”, eu dizia. e por mais que às vezes ainda pareça assim pra mim, eu sinto que tem algo sobre expor o que eu sentia – e ainda sinto – e penso e aprendo aqui que é a própria demonstração do que a escrita pode fazer por alguém.
na dúvida, escrevo.
quando não tem dúvida, escrevo também, porque escrever me traz clareza de pensamento, me inspira e me leva de volta pras motivações que me fizeram começar a escrever num primeiro momento. e mesmo que eu tenha passado por 1456 casos de distração entre escrever a primeira palavra desse texto e esse paragrafo que você lê agora, ainda me sinto focada em descobrir como fazer algo que já faço: gerar conexão através da escrita.
porque escrever é uma forma de oração.
é entrar em contato, por mais abstrato que isso pareça. os seus demônios nunca parecem tão grandes assim quando você coloca cada um deles listados numa folha de papel. os seus medos viram só ideias absurdas que você tem na própria mente, e que podem ser dissolvidas tão rapidamente quanto o secar da tinta na página. não tô dizendo que é simples, nem que é a solução de todos os problemas. mas tô dizendo que é um facilitador de compreensão de muitas coisas, incluindo de si mesmo.
e tem muita coisa que explica porque o escrever pra si é tão importante. dali, surgem insights que são transformadores. não sei se você sabe disso, mas Marco Aurélio – ele mesmo, o imperador romano -, também era filósofo e um dos seus livros mais famosos, chamado Meditações, era, na verdade, uma parte do seu diário pessoal. Anne Frank, conhece? diário. tem mais um monte de obras incríveis por aí e que são referência em literatura que surgiram de diários.
quer dizer.
e olha que louco. eu tava lendo O Mundo que Habita em Nós, da Liliane Prata, e ela conseguiu colocar em palavras o que eu mesma tava com dificuldade de falar. comecei a ler esse livro no fim de semana passada, mas ele já virou um dos meus favoritos da vida e eu nem cheguei na página 50 ainda. ela tava dando um exemplo de você andar por uma floresta e sentir algo em relação a ela e expressar essa sensação com a frase “que bela floresta!”.
mas sua frase não contém todo o seu sentimento, certo? você a diz como que para traduzir o que se passa dentro de você, mas essa tradução não passa de uma versão do seu sentimento, a ‘versão comunicável’. seu sentimento é muito mais amplo, mais vívido, mais selvagem – só parte dele se domestica em frases.
e foi aí que me caiu a ficha. na verdade, eu não preciso encontrar um jeito perfeito de explicar a importância da escrita pra quem quiser saber, eu preciso demonstrar essa importância enquanto escrevo. porque é isso que vai fazer a diferença. é isso que vai gritar pra quem me lê que tem algo aqui que vale a pena explorar, e, pra quem quiser, eu posso ser um guia dessa floresta.
a Liliane continua esse parágrafo explicando que é por isso que a literatura e a própria escrita são consideradas uma forma de arte, porque você busca as palavras que mais se encaixam na descrição de algo absolutamente abstrato, por isso, a coisa toda acaba soando meio como poesia. eu achei isso tão lindo!
e é sobre isso. é sobre essa demonstração. não adianta eu subir num palanque imaginário e gritar pros sete ventos que a escrita é uma ferramenta maravilhosa de autoconhecimento. eu preciso demonstrar que isso é assim.
e isso é assim.
porque cada post que tenho escrito aqui nos últimos anos e, principalmente, nos últimos 4 meses são um exemplo disso. cada postagem que tenho feito no Instagram é um exemplo disso. cada dia que escrevo no meu diário em busca de respostas pras Grandes Perguntas da Vida™ é um exemplo disso. eu sou a própria vivência disso.
e é bonito de ver, viu?
volto a pensar no Murakami (sim, virei fã) e como ele desenvolveu uma relação tão bonita com a escrita que ela é quase uma amiga com quem ele conversa por horas todos os dias. mas ao invés da voz, ele usa as mãos pra se comunicar. e juro que dei uma mini-risada aqui, porque me veio na mente também (e de novo!) Grande Magia, da Liz Gilbert, quando ela fala que a criatividade é uma entidade viva, uma parte de mim, que fica me convidando pra trabalhar junto com ela todos os dias, mas eu insisto em olhar pra ela como uma coisa mística e distante.
que besteira, ela tá agorinha mesmo sentada na minha frente me contando pra onde ir.
enfim. sinto, mais uma vez e com grande alegria, que esse é um daqueles posts que coloco meu coração inteiro na mesa e descubro junto de você que me lê o porquê de eu persistir na escrita e acreditar tanto nessa forma de arte como uma das mais bonitas que eu já conheci.
obrigada por estar aqui para apreciá-la junto comigo.
e, eu espero, que essa divagação em voz alta (metaforicamente, claro), tenha demonstrado pra você o quanto escrever é um processo salvador e de salvação pra todos nós.
agora, uma observação: no post anterior sobre escrita esqueci de agradecer as pessoas maravilhosas que fazem parte do clube de escrita desancorando e que me ajudam a manter o blog vivo e me inspirando a me aprofundar cada vez mais nesse assunto, na certeza de que farei minha parte na mudança do mundo a partir dele. é isso aí. profundo mesmo.
em segundo lugar, sempre bom lembrar que esse post contém links de afiliados da Amazon, o que significa que cada compra feita a partir deles rende uma pequena comissão para mim. mas não vamos deixar a transparência tirar da frente o objetivo desse post, que é colocar a gente mais perto do que realmente importa, tá bom?
queria saber mais de você: como você enxerga a escrita hoje?
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8 Comentários
Olá, cai aqui de paraquedas pesquisei sobre oração e seu blog me puxou como um ímã, estou sem palavras seu post me fez refletir sobre o quão importante a escrita tem sido para mim. Parabéns pelo seu trabalho ❤️
Olá, cai aqui de paraquedas pesquisei sobre oração e seu blog me puxou como um ímã, estou sem palavras seu post me fez refletir sobre o quão importante a escrita tem sido para mim, eu escrevo desde que tinha uns 14 anos ou antes nem pembro
é lindo ver como a sua relação com a escrita é um dos relacionamentos mais importantes na sua vida. confesso que dentre todas as formas de me expressar, a escrita é uma das que eu menos me sentia conectada, mas estou tentando mudar isso de uns tempos para cá. por volta dessa mesma época ano passado eu comecei um diário que ando mantendo até então e sinto que tem ajudado, tudo é um processo né? quem sabe um dia eu chegue a me sentir conectada de coração com a escrita, se bem que tudo que escrevo acaba já vindo do coração, enfim….
Biancaaaa, que legal saber que você tem conseguido manter um diário! é muito bom, né, só escrever o que tem na sua mente, o que você fez, o que dá vontade mesmo. eu amo. e não se preocupa, a relação com a escrita já tá aí com você. parece que não, mas ela faz parte de você! desenvolvê-la é só questão de tempo mesmo!
Oi, Maki!
Adoro ler seus textos cheios de emoção e amor pela escrita. Hoje, pela manhã, quando li o seu post fiquei agradecida por você me recordar que escrever é uma forma de oração. Logo depois de ler, peguei meu caderninho e escrevi um pouco sobre meus dias e meus pensamentos. Acredita, que depois disso, passei meu dia mais concentrada?!
Às vezes, me distancio desse hábito de escrever e me perco nos compromissos da vida quotidiana. Retorno a ele, na maioria das vezes, quando já estou sufocada e sobrecarregada com a rotina, notícias, compromissos. Enfim… quando estou cansada demais.
Estou feliz que você me recordou disso: escrever é uma forma de oração, de conversa com Deus. A escrita ajuda muito a esclarecer os pensamentos, preciso aproveitar mais esse hábito.
Beijos e abraços para você, Maki. Desejo um ótimo fim de semana!
ahhhh, Ana, que amor ler tudo isso!
e super acredito que você ficou mais concentrada, porque a escrita tem esse poder mesmo!
aproveite muito! porque escrever é uma delícia e ajuda muito a gente a lidar com a loucura dos nossos dias <3
Oi de novo Maki!!
Eu dei uma leve risada aqui de minha casa lendo esse texto. No momento q vc comentou que “não sab(ia) como dizer para as pessoa o quão é importante a escrita”, eu pensei que “você não precisa dizer nada, você já mostra muito disso”. E poucos parágrafos depois você disse com todas as palavras o que eu já tava planejando comentar. Um pouco chateado por perder meu comentário? Talvez kkk
Mas eu sempre digo o quanto ler seus textos é insipirador (pelo menos para mim). Ver a conexão que você tem com as palavras que deixa com ciúmes, pq eu tbm queria ter essa conexão (é um ciúmes saudável, don’t hold your breath). Essa tarde eu tava assistindo Wilde (1997) e foi muito louco ver como o Oscar (pelo menos o personagem do filme) tinha a capacidade de falar absolutamente tudo. E ele criava estórias do estômago assim, na tua frente, sem gaguejar. Pelo menos é isso que o filme mostra (vamo dar o benefício da dúvida). Mas sendo ficção ou não, é de dar aql ciúmes no estômago, não? “Eu quero ter esse relacionamento com as palavras também.”
Obrigado por mais um post, Maki 🥺🥺
ahahahahahahah ô meu Deus.
super entendo o que você quer dizer e desculpa se roubei teu comentário!
mas não fica com ciúmes, não! tem espaço pra todo mundo na relação com as palavras <3