solta essa faca e olha pra mim. pelo amor de Deus, sai de perto dessa borda. larga essa arma. respira fundo. ei, ei. olha aqui. eu sei o que tá passando no seu coração. eu sei o que você tá pensando. você tem tanta certeza, né? de que o mundo é um lugar sombrio e que não tem mais volta. é agora ou nunca, e você está pendendo cada vez mais para o agora.
se não é o fim, pelo menos essa é a desculpa perfeita para você sentir qualquer coisa que não seja a mão escura que esmaga o seu coração dia após dia. ver o vermelho do sangue parece muito mais convidativo do que continuar encarando o cinza dos seus dias. a tristeza. as lágrimas. você não aguenta mais chorar, não sabe o que fazer, pra onde correr, onde procurar ajuda. ajuda! ninguém te ajuda. parece que ninguém te nota, ninguém se importa. as pessoas estão muito preocupadas com o próprio umbigo pra olhar pra você.
você corta legumes imaginando o que aconteceria se a faca fosse um centímetro para o lado errado. se você tropeçasse agora na plataforma do metrô. se debruçasse o corpo um pouquinho a mais na sacada do prédio. pareceria um acidente. ninguém saberia a verdade. e você descansaria em paz.
porque é isso que você quer, num é? paz? que a sua cabeça pare com os pensamentos frenéticos e que você consiga respirar. você se sente sufocada e a possibilidade de machucar o próprio corpo é o único fiapo de controle que sobrou na vida. se nada mais, pelo menos você ainda tem escolha sobre o que quer fazer com esse corpo inútil. ninguém pode falar coisa alguma, a decisão é toda sua, no fim das contas.
você se sente sozinha. não consegue conversar com ninguém, ninguém te ouve. que a faca entre fundo, então, porque a dor de não ser vista e de encarar a tristeza do mundo é demais pra você. eu sei, eu sei bem. as lágrimas que me caem agora não me deixam mentir. eu conheço bem esse fundo de poço e, meu Deus, parece que não tem nada no planeta que faça essa dor parar. não tem luz no fim do túnel, é tudo uma ilusão e para o inferno com os otimistas. o que funcionou com os outros não vai funcionar com você. nunca funciona.
mas…
(e ainda bem que existe um ‘mas‘)
… você não tá sozinha. eu tô aqui com você. e eu sei que você consegue sentir a minha mão na sua e a minha respiração se confundindo com as batidas do seu coração. é, ele continua batendo, num ritmo constante, meio cansado dessa loucura toda. ele quer paz. assim como você.
olha pra mim. eu sei que no meio de todas as lágrimas você consegue me ver. a cor pode ser diferente, o formato do meu olho pode não ser igual ao seu – sempre me falaram que eu tinha olhos de mangá. mas olha bem. eu to aqui com você.
esquece tudo por um segundo. a dor. a confusão. o barulho frenético da cidade que não para nunca. as brigas que sempre acontecem na sala na hora do jantar. esquece o trabalho, a faculdade, as responsabilidades. por um segundo. só um segundo. larga a faca, solta a arma, se afasta da borda. respira fundo.
essa coisa confusa, essa massa sombria, ela não é você. ela te enche de medo, não te deixa ver o que tá bem na sua frente, ela te confunde e grita coisas sem sentido na sua orelha. ela parece tão real. mas ela não é você. aqui, nesse momento suspenso do tempo, você consegue ver que a gente tá junto? que tá tudo bem?
se você se machucar, eu vou sentir. eu sou saber. eu posso estar do outro lado do mundo, mas eu vou saber. porque eu e você… a gente é a mesma coisa. a vida que faz o seu coração martelar no peito é a mesma que a minha. não tem diferença, não tem distinção. é tudo uma vida só. e se você não cuidar bem dela, eu vou saber.
você acha que ninguém se importa, mas isso é mentira. eu me importo. eu tô te vendo sabe? eu entendo o que você tá sentindo e os pensamentos tóxicos que rodam a sua cabeça. eu sei como é. e eu sei também que tem saída.
você merece o mundo. merece o universo inteiro. merece você mesma de volta. a Terra e todas as suas tentações ficam até pequenas diante disso. da sua importância e de como é bom ter você por aqui. tem horas que parece o contrário, né? que todo mundo faz questão de te ter longe, mas não acredita na vozinha macabra que te diz o que fazer. ela quer que você se machuque, que você sofra mais e fique mais confusa até ninguém mais conseguir te ajudar a sair dessa zona.
mas, ó… a gente tá aqui agora. eu e você. você e eu. e eu sei o que os meus olhos estão te dizendo. que a gente é a mesma coisa, e que tudo bem você chorar, desabafar, achar que não tem mais força. eu confio que você consegue. eu confio que você vai achar a saída porque eu sei que você não tá sozinha. a gente pode fazer isso juntas.
essa vontade de se machucar, de morrer, eu sei o que é. ela é uma distração. ela é um sintoma de algo maior que você não consegue ver porque esses pensamentos malucos estão tirando a sua sanidade do caminho e colocando no lugar uma fantasia doida de que você merece sofrer. que merece passar por tudo isso e que faz parte chegar num ponto sem volta. que só assim as coisas todas vão se resolver. mas não vão. você não merece sofrer, meu amor. nunca mereceu, nunca vai merecer.
e eu sei. eu sei que você é livre pra fazer o que bem entender e que tudo parece conversa de maluco e nada do que eu falo faz muito sentido pra você. eu entendo que você só consegue ver através do túnel escuro e que o cinza do céu parece que nunca vai dar espaço pros raios do sol. mas eu me recuso a desistir de você. eu não vou desistir de você. porque você é importante.
e se tudo é mesmo uma escolha… bem, eu só posso esperar que você continue segurando na minha mão. que continue olhando nos meus olhos e buscando pela resposta que a gente vai encontrar juntas. eu espero que você escolha soltar essa arma. e eu espero que você escolha o amor.
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5 Comentários
Maki, obrigada.
Ler esse texto foi difícil, mas foi realmente como receber um abraço lá na beira do precipício.
*abraça mais forte ainda*
Texto lindo e profundo !!
Tentei ir embora deste mundo com uma alta dose de remédios mas não deu certo ! A pior parte dos meus dias se resumem em não ter amigos e ter uma família que sempre me ve como a menina que ajuda todo mundo, afinal não tenho amigos nem namorado ! . Desculpa o desabafo mas é que tá difícil é meu cérebro não descansa, se eu tivesse realizado meu sonho da minha faculdade de letras poderia estar fazendo algo de útil na vida !! Beijos e você é demais !!
Olá Maki, cheguei no teu blog tempinho atrás e logo me encantei pelos olhos dessa menina que escreve e toma chá. Teu texto é delicioso, fácil e me dá a impressão que tu vais bater na minha porta a qualquer momento e chamar pra andar no parque e quem sabe até tirar os sapatos e sentir a vida. Espalha teu amor por aí lindona. Fica em paz.
olha, Jo, bem capaz de eu fazer isso mesmo, viu? sou dessas de sair batendo na casa das pessoas (que eu conheço, claro) e que moram pertinho de mim pra gente sempre se abraçar muito e passar a tarde falando besteira jogado no sofá (ou no parque)