cotidiano

algumas pessoas já me pediram para escrever mais no blog sobre o tempo que eu passei na França. entre 2013 e 2014 eu morei 5 meses em Nice e foi uma das experiências mais incríveis e também mais tristes que eu já tive.

explico. ao mesmo tempo que foi maravilhoso passar esse tempo em uma cidade tão cheia de vida como Nice, eu estava na minha pior fase, no começo de uma depressão que só ia piorar dali pra frente e chegar no pico no final de 2014.

eu vou contar um segredo pra vocês: viajar não resolve os nossos problemas. confesso que quando embarquei pra Nice, era isso que eu esperava que acontecesse. que os meus problemas se resolvessem magicamente e que a minha vida fosse muito melhor em territórios franceses do que no Brasil. não foi isso que aconteceu.

sim, a França é incrível. Nice é maravilhosa e eu espero um dia poder voltar e visitar os lugares pelos quais eu passava todos os dias, tirando fotos mentais e tentando me lembrar para sempre daquelas cenas que me apreciam tão preciosas. até hoje eu tenho muito vívida na minha mente a cor do sol de inverno batendo nos prédios de estilo europeu e das folhas secas caindo na calçada com o vento e o chuvisco, das praias de pedrinhas e do azul do mar.

porém, me dói pensar nessa viagem. dói porque eu nunca me senti tão sozinha quanto naqueles meses. eu achava que me afastar do que machucava no Brasil era a solução que eu precisava para ser feliz. que ‘respirando’ e ‘passando um tempo longe’ eu colocaria a cabeça em ordem e ficaria bem, voltaria motivada e realizada.

no dia de voltar para São Paulo eu chorei tanto que por um minuto achei que poderia morrer de tristeza.

sabe o que é mais curioso? eu não viajei sozinha. eu fui com uma amiga maravilhosa, por quem eu tenho muito carinho, e que foi uma verdadeira companheira naquele momento. mas eu percebi por lá que ela precisava de tanta ajuda quanto eu e que só sair do país não ia mudar a nossa situação em casa. o problema era muito maior do que esse.

sabe, a gente tem essa ideia de que viajar resolve a nossa vida, que mudar de país é a solução de tudo, mas esquece que continua sendo a gente mesma, só em outro espaço físico. só porque eu estava na França não significa que eu estava bem ou que eu estava aproveitando como as pessoas achavam que eu deveria.

o que eu quero dizer com isso é que a lição mais importante que eu aprendi na França é que eu teria que pedir ajuda em um momento ou outro. porque o que eu estava sentindo não era normal, não era ok e não ia passar fácil assim. mudar de continente não ia resolver tudo o que eu estava sentindo, por mais que esse fosse o meu desejo mais profundo.

viajar é maravilho? é, sim, senhor. mas a experiência toda fica mil vezes mais deliciosa se a gente viaja com um propósito verdadeiro em mente, querendo se relacionar, aprender, ensinar coisas boas sobre a vida. caso contrário, a gente passa um mês trancada numa casa que não é nossa fazendo maratonas de séries e achando que tá tudo bem (aconteceu comigo).

eu amo a França e eu amo a oportunidade incrível que eu tive de ir para lá. E todos os dias eu sou grata por essa viagem ter me mostrado que eu não estava bem e que eu precisava urgente de ajuda. eu fugi do Brasil achando que essa era a solução dos meus problemas, que a minha vida se resolveria assim que eu tomasse o primeiro café sentada em uma calçada niçoise, mas acabei percebendo que os meus demônios me seguiram até lá e que era uma decisão minha encará-los de frente ou continuar fingindo que nada estava acontecendo.

eu lembro de acordar cedo para as aulas de francês, olhar o sol nascendo pela janela e pensar que não existe nada mais bonito do que um nascer do sol em Nice.  passar todos os dias pela feira de rua para chegar na Promenade d’Anglais e ver os locais escolhendo a dedo o que iam comer naquele dia era algo que me alegrava o coração. o barulho do mar e sentir o sol na pele, ver as crianças brincando no Parc de la Colline du Château, tudo isso fazia com que eu me sentisse viva. mas não era o suficiente para manter acessa uma chama que apagava cada vez mais.

talvez seja por isso que ainda parece difícil para mim falar sobre esse tempo, sobre essa outra vida que eu vivi. eu sou grata por cada segundo dela e por ter me mostrado como tanto faz o lugar que você está no mundo, a sua sensação não muda só porque você pegou um avião.

hoje eu entendo que, no fundo, tava tudo bem comigo, eu andava muito equivocada sobre quem era e quem eu imaginava ser e esse equívoco me trouxe onde estou hoje. por cada pessoa que fez parte dessa fase, por cada croissant e pain au chocolat que eu comi, por cada prova sobre os verbos irregulares em francês, por cada lágrima derrama enquanto eu estava sozinha ou acompanhada, por cada noite de danças desconexas no Wayne’s e por cada caminhada longa pela Promenade, tudo o que eu posso dizer a essa altura é: merci beaucoup e à bientôt. foi bom enquanto durou, e me ajudou a chegar mais perto de quem eu sou. mas, honestamente, ainda bem que acabou.

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Escrito pelaMaki
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8 Comentários
  1. Angela  em março 22, 2017

    Me relaciono muito com seu blog e seus desabafos de coração aberto. Sempre anoto algumas frases para poder levar para a vida e reler sempre que apertar a alma.
    Você escreve maravilhosamente, leve e simples. Mas ainda assim é profunda e séria, realmente apaixonante.
    Já passei por uma situação parecida, onde durante as minhas férias eu fiquei 3 dias deitada no quarto do hostel na Colômbia e fazendo maratona de série no tablet, pela simples vontade de sumir. Vontade que eu tinha quando eu estava no Brasil, mas que quando eu estava na Colômbia não continuou dentro de mim.
    Hoje faço terapia para tentar lidar com tudo que penso e sinto, mas ainda assim é um trabalho desgastante e um investimento grande a ser feito. Força para a gente, o futuro será mais belo quando conseguirmos enxergar tudo de bom que ele tem para mostrar.

    • Maki  em março 23, 2017

      Angela, entendo muito bem o que você diz. quantas vezes não fiquei em casa na França fazendo maratonas também? inúmeras! mas, sabe, tente olhar para esse processo com alegria. ele não precisa ser doloroso. ele nos ajuda a sair dessas amarras e dessa sensação ruim, só pode ser uma boa notícia! e força pra gente, que é muito mais capaz do que imagina!

  2. Mariana Maia  em março 20, 2017

    Eu tinha essa ideia de que viajar resolveria meus problemas internos. Mas mudei graças a um tweet que falava basicamente isso. Seus problemas vão te acompanhar aonde for. É preciso resolvê-los antes. Tive mais certeza ainda qdo a terapia me fez enxergar um comportamento comum meu durante uma viagem muito feliz. Eu tava muito feliz, mas me privava de viver em alguns momentos específicos.
    Tbm vi algo de positivo numa fase braba que passei. Pelo menos me serviu pra procurar ajuda, me fortaleceu de alguma forma, autoconhecimento, confiança. é como falam…no fundo do poço tem uma mola que te empurra pra cima.

    • Maki  em março 22, 2017

      nossa, Mariana, não poderia concordar mais! tem uma mola mesmo. e é exatamente isso que você falou. de nada adianta viajar achando que isso vai resolver os seus problemas, não vai. você precisa trabalhar em você primeiro pra poder aproveitar tudo ao máximo, como merece!

  3. Jéssica Lorena  em março 13, 2017

    Incrível que eu estou ainda enfrentando uma fase complicada e nos meus pensamentos sempre passam que se eu fosse embora eu me sentiria melhor, mas no fundo eu sei que eu só iria mudar o cenário 🙁 O importante mesmo é estar bem com a gente mesmo, aí dá pra curtir alguma coisa dessa vida

    • Maki  em março 13, 2017

      Jéssica, é isso mesmo! quando você fica bem com você mesma, tanto faz onde você está no mundo. o mais importante é cuidar do que você sente e do que você quer. ♥

  4. Clara Rocha  em março 13, 2017

    se perder e se encontrar é muito fácil quando estamos distantes. viajar é uma oportunidade incrível, com certeza e sei que tudo o que te levou a ir e tudo o que te levou a sentir lá, foi um grande aprendizado. com certeza não deve ter sido um momento fácil para você e nem para sua amiga. fingir que está tudo ok, quando na verdade não está é um drama que eu entendo perfeitamente. imagino o quão lindo deve ser lá, mas fico feliz que apesar de tudo isso tenha sido um caminho para você se re-descobrir. viajar não resolve nossos problemas não, mas tudo isso levou você ser quem você é eé isso que importa, somos um acumulado de nossas experiências ♥

    • Maki  em março 13, 2017

      exatamente. eu sou muito grata por tudo o que aconteceu e por todos esses momentos, que me trouxeram até aqui ♥