Carta aberta para uma amiga

Eu queria começar essa carta com raiva. Pensei nela por tantos dias que foi impossível não identificar que era isso mesmo que eu tava sentindo. Raiva. Não é horrível, não é triste, não é ruim. Mas era o que fazia a minha mente divagar e eu trancar a mandíbula enquanto dormia.

Eu poderia dizer que a raiva é culpa sua, e anos de amizade que se tornaram apenas conversas vazias e espaçadas pelo Facebook seriam uma justificativa plausível pra isso. Eu poderia dizer também que a causa é você ter me abandonado. Pois é, por muito tempo eu achei que você tinha me abandonado.

Foto: Luisa Chequer Fotografia

Mas, sabe, a verdade é que eu sinto a sua falta. Muito. E isso me deixa meio em conflito porque eu já sei que sentir falta de alguém não é legal. Eu sei que você está onde deveria estar, e eu estou onde deveria estar também. E tá tudo bem. Mas ainda não consegui transcender a saudade que eu sinto de você.

A gente passou por muita coisa juntas. E eu tenho saudade das nossas conversas sem sentido, das maratonas de comédias românticas, das sleepovers que sempre terminavam com uma sugar rush e uma sonolência sem tamanho, tudo por causa da quantidade absurda de doces que a gente sempre comia.

Eu sinto falta de conversar com você todos os dias, e penso em você na mesma frequência. A raiva? Bem… ela é minha. Eu sinto raiva porque criei expectativas demais, tanto pra você quanto pra mim. Sinto raiva porque errei e me sinto culpada. Sinto raiva porque você errou também. Sinto raiva porque parece termos chegado naquele ponto sem volta, em que tudo vira um sorriso amarelo e uma conversa sobre o tempo no elevador.

Eu não quero mais sentir raiva. Nem pensar em você com um peso no coração. Engraçado que também não gostaria que as coisas voltassem a ser como antes. Não. Não é isso que eu quero. O passado acabou, já foi, fim. Ele não existe mais. E pra fazer isso valer mesmo, eu preciso olhar pra você de novo e querer ver você por quem você é. E eu quero isso. De verdade.

Já escrevi cartas com pedidos de desculpas e mandei mensagens que foram lidas, mas nunca respondidas (e um lado meu ainda não consegue falar disso sem uma pitada de vingança). Tem horas que é preciso aceitar que é, de fato, impossível controlar qualquer coisa e eu jamais conseguiria forçar alguém a fazer algo que ela não quer. Acredite, eu tentei por muito tempo, sem sucesso. O resultado disso a gente conhece bem.

Sinto falta de saber como anda a sua vida e o que você tem feito. Por que você postou aquela foto? O quer dizer aquela legenda? Você postou uma coisa no Twitter que me deixou com a pulga atrás da orelha. Eu posso perguntar o que é? Eu ainda tenho esse direito?

Tô percebendo, aos poucos, que a resposta mesmo não importa. Eu tenho esse monte de coisa entalada na garganta e fico com os olhos marejados de lembrar como a gente era. Eu fico triste. Eu lembro que a gente caiu naquele limbo do ‘vamos marcar um café um dia’ e isso é tipo uma faca enfiada no meu coração.

Ao mesmo tempo. Eu agradeço. Agradeço por tudo o que aconteceu, pelas escolhas que fizemos e, sim, agradeço até pela distância que parece nos separar. É por causa de tudo isso (e outras mil coisas mais) que eu estou aqui, agora, querendo te ver de verdade pela primeira vez.

Eu não sei o que vai acontecer daqui pra frente, nem o que é melhor pra mim, pra você ou pra todos. Eu só sei que quero fazer diferente. Diferente do que eu já fiz e de como eu vivi até agora. Quero dizer que te amo (porque, mesmo algumas vezes parecendo que tudo o que eu sinto é raiva, essa é a verdade) e que estarei sempre aqui para quando você precisar.

Quero dizer que você é importante. Não só pra mim, mas para todos. Acredite que você é importante. Você sempre teve uma dificuldade em entender isso e fazia como eu, tentando se esconder atrás da cortina da sala, esperando passar despercebida. Quero dizer, sim, que sinto saudades, mas quero dizer também que entendo se a gente não conseguir voltar pra um lugar confortável. Tudo acontece exatamente da forma como deveria acontecer e pra isso eu só consigo dizer ‘amém‘.

Quero dizer que eu tô bem agora. Que passei por momentos muito escuros, em que eu tinha certeza que a vida não tinha saída, mas que agora eu vejo um propósito diferente para a minha vida. Eu descobri o motivo de tudo, a meta final, o verdadeiro objetivo. Então, sim, tá tudo bem.

Eu quero perguntar se tá tudo bem com você. Se você tem comido direito e longe do computador (não que eu tenha feito diferente), se você tem dormido bem e se a sua gastrite parou de atacar. Quero dizer ainda que o meu desejo mais profundo é que você seja feliz e que eu não quero nada além disso.

Eu queria dizer muitas coisas, mas sei que as palavras fariam pouco por nós duas. O que precisa acontecer mesmo está em outro lugar, não tem forma, muito menos sintática ou semântica. Eu quero aprender a me interessar por você de verdade e isso palavra nenhuma consegue fazer.

Se a oportunidade surgir, eu espero usufruir dela da melhor maneira possível. Se não, pelo menos eu escrevi esta carta, que tirou da minha mente os pensamentos que me atormentavam, e, here’s hoping, termina com uma sensação de amor.