rotinas com afeto

tem pouco tempo que eu descobri os podcasts do Tim Ferris e, num deles, o Seth Godin, que é tipo um dos mestres do marketing, tava falando sobre esse nosso medo de fazer coisas e dar a cara a tapa, sabe? eis que, num ponto da conversa, ele comenta sobre a sensação de falhar de uma forma que eu nunca tinha ouvido antes. ele falou como a maioria das pessoas se inscreve para maratonas sabendo que não vai ganhar – e que esse deveria ser o nosso parâmetro de sucesso.

não ganhar maratonas
não corri maratonas, mas saí pra caminhar pela primeira vez em sei lá quantos meses

eu fiquei pensando, sabe, como eu mesma conheço gente que correu uma maratona por muitos motivos – pra pagar uma promessa, pra marcar uma nova fase de vida, até pra provar pra si mesmo que conseguia. e isso é doido porque nenhuma dessas pessoas me falou que, em algum momento, esperava ganhar a tal maratona. sinto que esse propósito é para poucos, que se dedicam mesmo a isso (entenda: atletas profissionais).

tô falando disso porque a gente tem uma postura diante do trabalho como um todo (não só o criativo) que é absolutamente contra erros. num dá pra dizer que é “à prova de erros”, porque erros acontecem sempre. o ponto tá no peso que esses “erros” têm, e a maneira que lidamos com eles.

observando a minha vida e a forma como eu sempre me relacionei com trabalho, com projetos pessoais, até com as minhas relações de amizade e tudo mais, eu vi uma tolerância zero pra erros. mas tinha uma falha nessa Matrix, o fato de que eu já errei muito e as outras pessoas também. o resultado desse mix desastroso era uma sensação horrível que me corroía a boca do estômago e me deixava meio sem fôlego. parece que cometer um erro é um pecado mortal e eu seria executada em praça pública porque esqueci de acentuar uma palavra num texto ou porque não passei na farmácia pra comprar alguma coisa pra alguém, quando eu tinha dito que faria isso.

a ideia de erro também é muito volátil, né? é variável. o que é errado pra mim pode não ser errado pra você e vice-versa, mas acho que a gente pode olhar pra isso por um viés um pouco mais específico, que é a não-perfeição (e olha que “perfeição” é outro conceito beeeem variável).

trazendo isso um pouco mais pra perto, pro trabalho criativo e pras coisas que a gente tem vontade de fazer, outro dia eu vi no Instagram da Isa, do Engenheira Abroad, o repost de uma foto do Matt D’Avella em que ele dizia o seguinte:

se tem um vídeo ou post de blog que ainda está na sua caixa de rescunhos porque não está “perfeito”, eu desafio você a dar uma olhada nele uma última vez e compartilhá-lo com o mundo. você pode vomitar, mas pelo menos estará disponível.

ele tava falando justamente dessa coisa de querer que algo esteja 100% perfeito e dentro de todos os padrões que você imaginou antes de apertar o botão “publicar”, e como isso separa as pessoas entre aquelas que sonham grande e aquelas que realizam (isso me lembrou até um discurso que a Shonda Rhimes compartilha em O Ano em Que Disse Sim).

e eu não queria concordar com um discurso tão clichê e tão batido, mas é verdade. quando o assunto é escrever um post, por exemplo, eu mesma já publiquei milhares de posts nesse blog que poderiam ter sido muito melhores do que foram (especialmente quando se fala em imagens). mas, talvez por conta da prática e da profissão, eu entendi que deadlines têm que ser atendidos, prazos cumpridos e o texto tem que estar no ar em algum momento. é um desprendimento maior.

o que não significa que eu não pire em cima de cada coisinha que poderia ter sido melhor e evite fazer outras coisas, outros projetos, por causa dessa não-perfeição.

inclusive, no último final de semana eu participei de um curso com a Sue Coutinho (que é maravilhosa!) e ela falou justamente sobre esse medo que a gente tem de fazer alguma coisa não-perfeita e isso dizer alguma coisa sobre quem a gente é. o medo do julgamento externo pode até parecer real, mas acho que ele nasce mesmo num julgamento interno, uma comprovação de que, veja só, estávamos todos certos e somos incompetentes e incapazes de fazer uma coisa legal.

num mundo hiper conectado, a gente lida ainda com o medo de virar meme (o brasileiro não perdoa uma, afinal) ou de ser cancelado (a Rowena Tsai falou um pouco sobre isso no último vídeo que ela publicou e é maravilhoso!) – os dois fantasmas da atualidade que perseguem qualquer um que já fez qualquer coisa pra internet. é a tal da reputação a zelar.

eu olho pra minha lista de projetos e pras ideias que tenho na mente e me pergunto onde elas foram parar no minuto que vejo alguém fazendo exatamente o que eu tinha pensando só que muito melhor (segundo as vozes da minha cabeça). “eu poderia ter feito isso”. pois é, mas não fez.

a Thais Godinho vive falando sobre “o feito é melhor que o perfeito não feito” e eu sinto que essa frase ganhou um novo grau de solenidade na minha cabeça porque o fato é que eu nunca vou alcançar o perfeito que eu imagino. porque é uma imaginação, e imaginações não existem.

no âmbito dos fazeres, o que eu posso fazer é tentar, e tentar de novo, e ajustar a rota conforme caminho, trocar o pneu com o carro andando, como dizem por aí, na esperança de que o resultado final (se é que há um final) seja algo que eu me orgulhe em dizer que fiz, por mais que não seja perfeito.

tenho um post engatilhado pra falar sobre isso HÁ MESES (olha aí, o tal rascunho que me assombra) e que fala sobre como a gente precisa ser um pouco mais humilde ao assumir o papel de aprendiz, de aluno, e a olhar para os nossos erros como oportunidades de aprendizado e não como auto-condenações. eu uso cada mínimo errinho pra ser minha própria juíza e capataz, determinando a sentença e o seu cumprimento, tudo isso num espaço de um pensamento por segundo.

parece que, ao falar sobre arte, fica mais fácil entender como esse lugar funciona. aprender a desenhar depois de grande? imagina, num dá. aprender a tocar piano? nossa, é muito difícil, eu não consigo. virar fotógrafa? nossa, que isso, já passei do tempo de tentar uma coisa dessas. tudo enraizado nesse mesmo medo de que se não sair perfeito de primeira, não valeu a pena.

nesse ponto, acho que os norte-americanos acertaram muito com essa cultura empreendedora do errar rápido pra acertar lá na frente – por mais que eu esteja tão cansada da conversa startapeira quanto qualquer pessoa.

enfim, me peguei amarrando as próprias mãos pra me impedir de fazer algo que eu queria com medo de um ridículo que eu supostamente vou passar no futuro. no medo de errar, melhor nem fazer.

o problema é que isso me deixou triste. e eu não quero viver triste.

então, a reflexão pode ir pra um outro lugar, um lugar que também é clichê, mas que que talvez seja mais saudável, de vai com medo mesmo e a coisa se resolve no caminho. depois de ler A Troca, de Beth O’Leary, e de assistir aos primeiros episódios de Navillera, na Netflix, me peguei pensando que prefiro vomitar depois de publicar um post que tá nos rascunhos há meses, gravar um podcast ou fazer um vídeo pro YouTube, do que chegar nos meus noventa e tantos anos triste por não ter feito o que eu não sonhei fazer.

e olha que tô pensando pequeno, hein?

o Seth me fez pensar nisso. em olhar a vida como uma maratona que eu não tenho a pretensão de ganhar, e talvez eu precise treinar mais um pouco pra não perder tanto o fôlego nos primeiros 3 quilômetros, comprar tênis melhores pra não ter tantas bolhas ou passar aquela pomadinha protetora pro atrito da roupa não machucar tanto a pele. mas um dia depois do outro, eu percebo que o ridículo não vem, ele era só uma imaginação na minha cabeça.

e imaginações não existem.

Compartilhe!
Escrito pelaMaki
Deixe seu Comentário!


Warning: Undefined property: stdClass::$comments in /home1/desan476/public_html/wp-content/themes/plicplac/functions.php on line 219
4 Comentários
  1. Bianca  em maio 11, 2021

    esse texto me lembrou do kdrama run on, acho que pela ideia da maratona. enfim, concordo com você. acho que há várias coisas que colocam pressão em cima da gente o suficiente para que nós mesmos transformemos a nossa vida em algo pesado e coloquemos mais pressão por medo de ser imperfeito ou de errar.

    • Maki  em junho 14, 2021

      Bi, cê acredita que eu não vi esse drama, ainda???? preciso muito tirar esse atraso.
      mas é sobre isso <3

  2. Thamara Laila  em maio 05, 2021

    Oi, Maki. Acho que nunca tinha pensado também sobre vencer a maratona, sempre conectei maratona a participar e a preparação nunca a ganhar, que coisa né? Lendo o texto me lembrei muito de uma passagem de A Coragem de Ser Imperfeito, da Brené, onde ela questiona: “o que vale a pena fazer mesmo que você fracasse?”. A primeira vez que li esse questionamento, algo dentro de mim se libertou e foi assim que comecei meus últimos movimentos com o canal, a empresa. Sempre muito bom ler o seu olhar e sentir <3

    p.s: como é bom ler um texto e nele mesmo já ter links para novas conexões.

    • Maki  em junho 14, 2021

      Thamara, cê acredita que eu ainda não li esse livro? absurdo, né? já vi o documentário e o Ted da Brené, mas o livro, não li ainda. tá na listinha!
      mas é sobre isso e sinto que, de alguma forma, é isso que tem movimentado tudo o que eu faço também <3
      brigada pelo seu comentário!
      (e fico feliz pelas novas conexões!)