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tartarugas até lá embaixo

eu gosto muito do John Green. sério, A Culpa é Das Estrelas é um dos livros mais lindos que já li e esperei ansiosa pelo o que ele escreveria de incrível nos anos que se seguiram. porém, não vou mentir: Tartarugas Até Lá Embaixo foi um livro muito difícil de ler.

por quê? porque eu já fui a Aza um dia. eu nunca fui diagnosticada com TOC, mas eu já tive depressão. e eu sei o que é essa espiral de pensamentos que a personagem passa o tempo inteiro. eu sei o que é o medo de se envolver com outra pessoa por ter uma certeza inata de que ninguém nunca vai saber o que é viver dentro da minha cabeça e, vamos combinar, ninguém merece conviver com alguém assim.

eu nunca tive um band-aid que precisava trocar todos os dias, mas eu tinha a mania de cravar a unha na palma da mão quando estava ansiosa. ou nervosa. ou quando alguém falava comigo sobre assuntos que me deixavam desconfortável. machucava. doía. às vezes sangrava.

honestamente, a história do livro, pra mim, ficou em segundo plano. o que me tocou foi a maestria com que o John retratou a maneira que a Aza pensa e que, eu tenho certeza, também representa a forma que ele pensa. inclusive, tem uma frase do livro que foi a mais marcante pra mim e que fala exatamente o que eu quero dizer:

“pensamentos são só um tipo diferente de bactéria, nos colonizando”

você sabe o que é isso? essa quantidade absurda de pensamentos que ficam girando na nossa mente e que não deixa a gente em paz? essa coisa frenética que a gente fica pensando pensando pensando e parece que não consegue controlar? então. pensamentos são só um tipo diferente de bactéria. 

tartarugas até lá embaixo

o que me deixava de coração apertado, enquanto eu lia Tartarugas Até Lá Embaixo, é que o John, assim como tantas outras pessoas, não encontrou a saída pra isso. é claro que, no livro, a Aza acha um certo nível de paz – a gente entende isso na evolução da narrativa (e acho que nem teria como ser diferente). mas tem muito a coisa do ‘tenho que aprender a viver com isso‘ embutido, sabe?

eu sempre achei muito doida essa ideia da gente ter que aprender a lidar com as coisas e a conviver com o que faz mal. ‘a vida é assim‘. ‘isso acontece‘. ‘você tem que aprender a lidar com a doença‘. taí uma coisa que eu não aceitei quando o meu psiquiatra disse. que eu teria que aprender a conviver com a depressão. eu me recusei. eu bati o pé. eu fiquei brava. eu disse que jamais aprenderia a conviver com aquilo porque aquilo não fazia parte de mim. e não faz parte de você. e não faz parte da Aza.

a questão é que tá todo mundo cego pra saída e ninguém consegue percebe que ela tá bem na nossa frente. e a saída é, justamente, entender que os pensamentos são bactérias e, como tais, a gente consegue se livrar delas. pensamentos são só pensamentos. e eles precisam ser tratados assim. mas a gente se confunde, acha que eles são reais e que eles têm poder sobre a gente. que eles são mais fortes. mas isso é mentira.

não é fácil, sabe? esse treino. a gente precisa de ajuda. precisa de orientação e precisa de paciência. é um treino diário, de hora em hora, de minuto em minuto. exige dedicação. a gente aprende a gostar da gente de verdade aos poucos, nesse treino. e a se perdoar também. a cura ta aí, entende?

eu me contorci lendo as palavras do John. cheguei a ter uma crise. larguei o livro por uns dias. voltei depois, lembrando de quem eu sou e da verdade sobre mim. terminei de ler com a certeza de que aquele deve ter sido um livro muito difícil de escrever também, mas um dos melhores que o John já fez.

tive vontade de cravar a unha na palma da mão de novo e fiquei enjoada com o vai e volta da mente da Aza, porque eu me reconheci ali. eu me vi retratada. a loucura do dia a dia, o pensamento que começa pequeno e vai ganhando força, as brigas internas. tudo isso cansa. eu terminei o livro exausta.

ao mesmo tempo, terminei aliviada. porque eu sei que pensamentos são só pensamentos e eles não são mais fortes do que eu. e eu treino, e eu me lembro e eu uso isso pra lembrar os outros também. acima de tudo, eu espero, de coração, que o John tenha encontrado uma saída pras espirais de pensamento dele, e que ele entenda que não precisa aprender a conviver com nada – mas que a cura existe e ela está ao nosso alcance, basta a gente colocar os pensamentos nos seus devidos lugares.

se você se sente como a Aza, ou como eu me senti, não fica com medo, tá? não tem nada errado com você. e você pode pedir ajuda pra superar isso, você pode ir atrás de pessoas que vão te mostrar o caminho. você pode tomar um remédio também, tá tudo bem em tomar uma pilulazinha todo dia de manhã (eu já fiz isso). o mais importante é você lembrar, de novo e de novo, que isso são ferramentas pra te ajudar a voltar a ser quem você é – você não é definida pelos diagnósticos que te dão ou pelos remédios que toma, mas por tudo aquilo que te faz abrir os olhos de manhã e sentir o coração batendo no peito.

você recomenda a leitura de Tartarugas Até Lá Embaixo, Maki?‘ sim, recomendo – e você pode, inclusive, comprar o livro clicando nesse link (é o meu perfil de associados da Amazon, tá bom?). mas acho que o aviso é válido: se você não tá legal, se acha que não tá 100%, talvez seja melhor esperar um pouquinho e não se envolver com a história da Aza por enquanto.

seja um personagem fictício, um autor de livros young adult ou você que me lê nesse blog, o que eu mais desejo é que todo mundo fique bem e que a gente termine os nossos dias com a certeza de que tá caminhando de volta pro que a gente é de verdade.

tartarugas até lá embaixo

você já leu esse livro? me conta o que achou nos comentários?

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Escrito pelaMaki
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12 Comentários
  1. Suellen Toledo  em março 10, 2018

    Só de ler as primeiras paginas já fiquei com medo de continuar a leitura. Eu sofri muito de ansiedade ano passado e esse ano ainda estou me recuperando. Mas como estou em fase de recuperação estou com medo de ter alguma recaída. Como você disse que se não tiver pronta ainda seria melhor deixar pra la… então decidi seguir seu conselho. Por enquanto não vou ler… Beijo!!!

    • Maki  em março 10, 2018

      boa, Suellen! lê quando você estiver mais tranquila mesmo ♥

  2. Karoline Lima  em fevereiro 17, 2018

    Assim como tu, também não liguei muito para a história do livro (aquela investigação é bem fajuta kk). Essa foi minha primeira leitura do ano e me senti extremamente representada com as explicações que a Aza dava de como se sentia e de como os pensamentos ficavam rondando a mente dela de uma forma incontrolável. É horrível.
    Foi muito difícil de ler, porque eu me li e vi como estava tudo sendo sufocante demais. Mas foi ótimo ter palavras que conseguissem explicar o que, até então, eu não estava conseguindo explicar.

    Quando eu li a frase que pensamentos são só pensamentos, percebi como eu estava/estou dando importância demais para todos eles, como estão controlando minha vida de uma forma louca. Realmente, são só pensamentos, mas as vezes, quando vem todos de uma vez só, é quase impossível acreditar que não vai acontecer o que eles estão dizendo. Mas, como você disse, é uma tarefa diária e difícil de convencimento. 🙂

    • Maki  em fevereiro 22, 2018

      exato, Karol! são passinhos de tartaruga, sabe? um dia de cada vez, e você vai treinando isso, de não dar atenção e realidade pro que você pensa.

  3. Graciela  em fevereiro 15, 2018

    Puxa precisava muito ler isso.
    Obrigada

    • Maki  em fevereiro 22, 2018

  4. clara rocha  em fevereiro 15, 2018

    Ainda não consegui ler o livro, primeiro porque toda vez que vou comprar acontece alguma coisa e me tira do rumo (o que conveniente tem me deixado com uma pulga atrás da orelha para pensar se seria o momento certo de ler) e o segundo é porque eu sei que de certa forma a história vai mexer comigo e aí eu fico na expectativa para saber como vai mexer e acabo deixando para comprar outros livros. Mas estou ansiosa Maki, para ler. Eu gosto da escrita do John Green, embora eu confesse que ele não seja meu autor de YA favorito (afinal de contas, Jenny Han, Raimbow e Kiera Cass estão aí né!?) mas já li os outros livros dele então acho que nada mais justo ler o novo. Quando eu ler, volto a comentar com você sobre o que eu achei.

    Eu não sei como é me sentir da forma que você disse que já se sentiu. Eu nunca me senti assim, nunca tive certo tipo de toc. Mas imagino como seja. Eu acredito em tudo que você diz: VAI FICAR TUDO BEM. ♥ Não tem nada de errado com você. ♥ Tem um final bom. ♥

    • Maki  em fevereiro 22, 2018

      aaaaa Clarinha. só amor por você ♥ sim, pois é. talvez esse não seja o melhor momento pra ler. mas não se preocupa e vai fazendo o exercício de lembrar que o livro é só uma representação do que o John pensa também, uma forma de você conhecer ele melhor, sabe? ♥

  5. Êrica  em fevereiro 15, 2018

    Hey Maki! Foi muito bom ler a sua resenha. Eu também sou super fã do John e corri para ler esse livro. Inclusive já até resenhei também. Mas a sua perspectiva da coisa me chamou bastante a atenção. Eu também sofro com as tais espirais, por que tenho crises de ansiedade enormes. E gostei muito de ver em um livro uma personagem como a Aza. Tenho a impressão de que a maioria dos autores, assim como a maioria das pessoas, preferem escrever (ou conviver com) sobre pessoas bacanas, entende? Tipo, super inteligentes, ou aquele velho padrão do “bonitas e meio fúteis”. Gosto como o John sempre põem uma característica nos personagens que representem pessoas normais. Pessoas com defeitos, com doenças, com manias, com espirais de pensamentos. E, por mais que eu tenha adorado toda a representatividade, foi interessante ver que talvez isso não seja tão fácil para todo mundo que também convive com espirais, sabe?! Perspectivas! <3 Obrigada por compartilhar tudo isso com a gente, beijão!
    remenor.com.br

    • Maki  em fevereiro 22, 2018

      Érica, como você é fofa! sim, eu acho super importante a representatividade que ele coloca nos textos… é o que faz dele um autor tão querido, né? a gente se vê representado ali. de qualquer maneira, o que eu amo na internet é que ela te possibilita essas visões diferentes, essas perspectivas, né? e isso é o mais legal, a gente poder ter visões distintasde um mesmo assunto.

  6. Michelle  em fevereiro 14, 2018

    eu achei o livro bom, mas não achei essas “coisa toda” que falaram. eu me identifico com os pensamentos invasivos e as espirais que vem junto, apesar da origem dos meus pensamentos ser diferente dos da personagem. mas a trama e o romance eram fracos e só sobrava as espirais dela e depois de um tempo a Aza me cansou e eu só queria concluir a leitura, pq de ansiosa já basta eu. não achei os outros personagens realistas e aquela amiga dela, pelamor? até achei algumas conversas da Aza com a terapeuta interessantes, mas no geral não me involvi muito. ainda bem, pq realmente não preciso ser sugada pelas espirais de outra pessoa, muito obrigada…

    • Maki  em fevereiro 22, 2018

      eu acho que as espirais dela eram o foco mesmo, porque também senti o resto da história meio sem graça. tipo, como se fosse o coadjuvante mesmo. o protagonista era o que ela sentia e pensava. sigo em dúvida se curti ou não, acredita?