cotidiano

eu fui salva

me peguei observando a felicidade de soslaio e me perguntei mentalmente como é que eu vim parar no meio dessa bagunça alegre. seria mentira dizer que eu não sei o caminho que fiz até aqui, e uma falácia ainda maior ousar falar que eu não gosto disso.

qualquer olhada ao redor me faz chorar copiosamente. logo eu, a Maria Chorona da infância. vamos dizer que não era difícil me fazer cair aos prantos. não que precise muito para isso acontecer hoje também. mas é um choro diferente. se antes era sofrido, dolorido, triste, hoje só choro se for de alegria.

eu tinha uma certeza muito grande no meu coração de que a vida não valia a pena ser vivida. de que desistir de tudo era a solução para os meus problemas e de que morrer era a única saída pro que eu sentia. eu via o mundo tal qual uma fotografia antiga: em tons de preto e branco ou com um filtro sépia que de hipster não tinha nada. a vida não tinha cor. não tinha carinho. não tinha vida.

lembro de um dia olhar pela janela do carro, enquanto minha mãe me levava pra faculdade, e dizer pra mim mesma ‘eu tô só existindo‘. o próprio meme ambulante. mas a pergunta não tinha nada de engraçada. não tinha nada de irônica ou de retórica. tinha uma carga de tristeza que nem eu conseguia carregar mais. tinha uma dúvida de uma vida inteira, dentro de tão poucas palavras.

olhando para as últimas semanas que tive, me peguei sorrindo à toa, querendo ficar junto das pessoa que eu amo, buscando desculpas para ficar perto daqueles que já estão perto (não que desculpas sejam necessárias pra isso, que fique bem claro). e não preciso ir muito longe para perceber que a Maki de alguns anos, que se perguntava o que estava fazendo com a própria vida, sumiu. ela, de fato, morreu. aqui jaz a Maki do Passado™, que um dia acreditou que a morte era a solução e que a vida não tinha sentido.

eu renasci. eu revivi. eu encontrei o amor. e encontrando o amor percebi que precisaria me despir daquela pessoa que eu achava que era pra viver a vida que é minha por direito. a que é feliz, a que é alegre e que é plena, abundante e completa. a que não reconhece a falta, a que não vê o ódio, a que a ama a todos igualmente.

sim, aquela Maki morreu. mas isso não é triste e de perda não tem nada. pelo contrário, eu celebro o seu fim cada dia mais. porque o momento que ela decidiu partir foi o mesmo em que eu decidi ficar. eu me dei uma segunda chance. eu optei pela porta número dois, eu me deixei guiar pelos mágicos que diziam palavras bonitas sobre o amor e que pareciam não sofrer com dias tristes. mal sabia eu que de mágicos eles não tinham nada.

de corpo vivido, sou mais velha do que antes, porém mil anos mais nova. visto o que me deixa com um quentinho no coração. como comidas gostosas. recebo abraços carinhosos. ganhei parceiros de jornada e tenho por todos os lados anjos que me guiam pelo caminho certeiro em direção a meta final: voltar pra casa e enfim descansar o meu coração onde ele surgiu. onde só existe luz e calor e carinho e paz, virando a direita na rua da gratidão, duas quadras depois do perdão.

nossa, a gente é muito feliz, né?‘ hoje digo essas palavras com um coração que ocupa o mundo inteiro e mais um pouco. olho nos olhos e me sinto contente, recebo um beijo e me vejo plena. vejo as pessoas dançando numa pista de dança improvisada e montada com todo o carinho do mundo e tenho vontade de cantar as mais belas músicas já escritas, recitar todos os sonetos de Shakespeare e encarnar a Julieta no seu balcão: ‘aquilo a que chamamos de rosa, com qualquer outro nome teria o mesmo e doce perfume…’

hoje eu existo. eu vivo. eu amo. eu aprendi a ver, e aprendendo a ver reaprendi sobre quem eu sou. eu me lembrei. eu sinto. eu sei. tão claro quanto as vozes que ouço na cozinha, os meus colegas de quarto conversando sobre um filme que assistiram mais cedo. tão alto quanto os latidos do cachorro na esquina. eu sei. o que eu sou não muda. o que eu sou ama. o que eu sou é feliz. portanto, eu sou feliz.

e com esse coração leve, eu só sinto gratidão pela Maki de antigamente, a que desapareceu. porque ela decidiu ficar. e escolheu sair de cena pra eu voltar a ser eu mesma, pra eu poder amar de novo. pra eu olhar pra um dia como esse e ter a plena e feliz certeza da veracidade dessas três palavras que rondam a minha mente diariamente, e que exprimem, tão simplesmente, tudo o que me aconteceu:

eu. fui. salva.

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Escrito pelaMaki
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5 Comentários
  1. viniciusregozijo@gmail.com  em setembro 21, 2017

    Ual que esplêndido. É uma relembrança né? Um reencontro!!! Inspirador.

    • Maki  em setembro 21, 2017

      é mesmo ♥

  2. Cirlei  em setembro 20, 2017

    Tão eu…rs.
    Obrigada pelo lindo texto.
    Bjs

  3. Ana Beatriz  em setembro 19, 2017

    Ah que lindo. Eu te entendo de verdade. Essa segunda porta que você abriu a um tempo, estou começando a abrir agora. Tem dias difíceis, mas tem dias ótimos e eu sei que tudo vai ficar bem. Os dias ótimos e os seus textos me provam isso.
    Gratidão.

    http://littlemorgana.blogspot.com.br/